- Março 14, 2022
Empréstimo para pagar resgate de água e saneamento chumbado pelo Tribunal de Contas
O Tribunal de Contas recusou o visto aos dois contratos de empréstimo submetidos pelo município de Paredes, no montante total de 21 milhões de euros, para pagamento do resgate da concessão da exploração e gestão dos sistemas de abastecimento de água para consumo público e de recolha, tratamento e rejeição de efluentes do concelho.
Em causa estão desconformidades com o Regime Financeiro das Autarquias Locais (RFALEI).
O documento foi tornado público pelo Movimento Juntos por Paredes, que diz que “tem havido falta de verdade para com os paredenses” e que a “imprudência” deste executivo poderá “provocar maiores danos no futuro do concelho“.
“A autarquia continua a não ter uma estratégia clara e concertada com as diversas entidades envolvidas, e vai decidindo conforme os obstáculos que vão surgindo. Uma atitude que consideramos imprudente e que chega ao ponto de desprezar todas as recomendações das entidades reguladoras”, frisa Manuel Pinho, representante do Juntos por Paredes, que pede uma atitude mais responsável e transparente ao executivo.
“Paredes é um concelho de bem, deve por isso assumir os seus contratos e, dessa forma, obrigar a concessionária a realizar o investimento que está em falta, num curto espaço de tempo”, acrescenta.
Contactada, a câmara de Paredes garantiu que o município já recorreu da decisão do TC, estando a aguardar o pronunciamento do recurso.
No acórdão de 21 de dezembro de 2021 o Tribunal de Contas diz que o Ministro das Finanças deu parecer favorável para o aumento da dívida resultante do exercício do direito de resgate, estando cumprido esse item. No entanto, “enquadrar o pagamento como “preço” do resgate (conforme se diz nas duas deliberações, tanto do executivo, como da assembleia municipal), não é correto e induz em erro”. “Em rigor, como se viu, consiste numa indemnização. O seu valor só está definitivamente fixado se ela estiver quantificada no contrato com um valor, estando por isso já liquidada, ou se o concessionário concordar com o seu montante”, lê-se no documento.
Além disso, acrescenta o TC, o município não pode fixar a indemnização “de forma potestativa” e “o recurso a uma empresa externa, por si escolhida, para a determinar tem somente o valor que a correta aplicação dos critérios previstos no contrato revista em termos técnico-científicos”.
No acórdão os juízes conselheiros citam ainda o parecer negativo da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) que referia que apesar de não ter à sua “disposição (…) todos os elementos necessários ao cálculo da indemnização devida pelo município à concessionária por força do exercício do resgate”, “os dados disponíveis permitem admitir que o valor da indemnização seja superior ao montante apurado pelo município, em qualquer dos cenários por si considerados” e recordam que a concessionária interpôs uma ação no Tribunal Administrativo do Porto a exigir uma indemnização de 132 milhões de euros, valor que pode ser ainda mais elevado uma vez que são pedidos juros de mora.
Para o Tribunal de Contas “é claro que o valor da indemnização, logo da responsabilidade do Município, não está assente e pode mesmo ser de valor superior, ou muito superior, àquele que este último apurou e que os empréstimos visariam satisfazer” e, por isso, “legalmente não poderiam ser utilizados para satisfazer essa obrigação”.
Sendo assim, as deliberações da câmara e assembleia municipal que aprovaram a contratação destes empréstimos de médio e longo prazo violam uma norma financeira (art. 51.º, n.º 1 RFALEI) e “são nulas”, conclui o tribunal.